Já faz algum tempo que não escrevo nenhum artigo de opinião, mas sinto chegar a altura de colocar o dedo na ferida mais uma vez.
Chegou
o momento de se dizer a verdade, dos Treinadores terem a coragem de
dizer o que pensam sem receio de represálias, ou com medo de hoje,
amanhã ou em outro dia qualquer não poderem ir para este, aquele ou
outro clube em virtude da frontalidade.
Eu,
em 24 anos de futsal, 13 como jogador, 11 como treinador, já vivenciei
de tudo. Desde 1993 que ando neste mundo fantástico que é esta nossa
modalidade. Passei por muitas fases e todas elas distintas: joguei numa
1ª divisão projetada em duas zonas, norte e sul. Fui, dos muitos
jogadores, formados em futebol de 11, que vivi na pele a fusão em
1996-97, entre o futebol de 5/ futsal. Essa fusão obrigou os jogadores,
que até então podiam jogar futsal ao sábado e futebol de 11 ao domingo,
em clubes diferentes, a realizar uma escolha, ou uma modalidade, ou
outra. Eu, felizmente, optei pelo futsal.
Essa
opção levou-me a vivenciar experiências de distrital, 3ª, 2ª e 1ª
divisão, quer como jogador, quer como treinador. Desde a alteração de
uma 1ª divisão em duas zonas para uma só nacional, de uma 2ª divisão
dividida em apenas duas séries para sete, de uma 3ª divisão de 4 séries
passar para seis até ser exterminada.
Passei
pelas dificuldades inerentes ao que era estar numa 1ª divisão: muito
difícil para qualquer equipa que chegava da 2ª manter, ao contrário do
que atualmente acontece, onde se torna muito mais fácil. Pela qualidade
de duas zonas da 2ª divisão nacional, onde em 28 equipas, subiam 4 e
desciam oito. Agora, em 68 sobem 2 e descem 18 ou 20, conforme os
apetites de quem manda.
Muito
mais difícil subir à Liga Sportzone, muito mais difícil manter na 2ª
divisão. Passei uma única vez pela 3ª divisão, com qualidade acima das
distritais, mas necessária para as equipas ganharem alguma maturidade e
experiência para depois vivenciarem o que é estar pelo menos numa 2ª
divisão. Era uma ponte para se atingir um caminho para se conseguir dar
luta na divisão superior, caso esse clube subisse. Neste momento, essa
travessia não existe, foi completamente exterminada desde a época 2014
com a entrada do propalado “Plano Estratégico para o Futsal”. Agora, é
muito mais fácil para uma equipa do distrital subir para uma 2ª divisão,
mas na maior parte das vezes, muito mais difícil de manter. Pois, a
travessia da experiência deixou de existir.
Mas
vamos então ao cerne da questão, ao que me levou a escrever este artigo
de opinião, que acredito ser a de muitos, mas que é a minha sem dúvida.
Qual o caminho a seguir para a 2ª divisão nacional atual? Qual o futuro para a mesma?
O primeiro ponto e mais importante á alterar os quadros competitivos.
É
dizer: “erramos”, a ideia de exterminar a 3ª divisão não surtiu os
efeitos desejados e encontrar uma alternativa. Mas a alternativa não
pode ser uma 2ª B ou uma Liga de Honra, pois estamos fartos de andar ao
reboque do futebol de 11. A verdadeira alternativa é voltar a criar uma
3ª divisão, doa a quem doer. Olhem para nós com olhos de ver e não como
um enteado do próprio pai. Ou então, deixem as pessoas do futsal mandar
no futsal e fazer renascer a federação portuguesa de futsal.
Dentro
dessa alteração, do renascimento da 3ª divisão, a 2ª tem que voltar ao
formato antigo. Nós, Treinadores, temos de fazer ver isso aos clubes que
treinamos, para que os nossos clubes façam força perante os nossos
representantes. E aí, os nossos representantes, as associações
distritais, tem de mostrar a independência do “grande chefe”. Tem de
saber emancipar-se e atingir novamente o seu estatuto, para não apenas
dizer amém. Nós, Treinadores, não devemos ter medo de dizer o que
pensamos ser o melhor para o nosso futsal. Não devemos ter medo de
sofrer as represálias de chegar ao ponto de recear não ter clube na
próxima época pelo fato de termos sido corajosos, frontais e verdadeiros
sobre o nosso futsal. Porque fomos nós, treinadores, jogadores, clubes
que criamos o futsal. Não foi a FPF. Ela apenas se serve de nós para
continuar a encher os bolsos. E continuam assobiar para o lado. Porque
os verdadeiros problemas ninguém no-los resolve. Ou então digam-me como é
possível vários clubes que apenas apresentam jogadores formados no
clube nos seniores pagarem multas atrás de multas porque não tem
jogadores formados localmente. Isto é o quê? Brincar connosco, brincar
com os clubes, brincar ao futsal. É apenas um exemplo, há mais.
Eu,
felizmente, sou mais um dos muitos treinadores que tenho a felicidade
de não ter que dobrar a espinha para ficar bem visto nos corredores. Sou
um dos que já foi atingido por anteriormente ter colocado e dedo na
ferida e exposto uma situação grave, que de certeza continua a ocorrer
por esse país fora. Fui atingido, mas conseguir reerguer-me, consegui
voltar e não ficar esquecido. Aí, tenho de agradecer a quem apostou em
mim e me fez voltar à minha modalidade. Mas o problema subsiste:
continua a ver muitos treinadores e muitos dirigentes a dar entrevistas
sem pôr o dedo na ferida do futsal.
Neste
momento, esta 2ª divisão não cabe na cabeça de ninguém, a não ser de
quem a quis alterar. Neste momento, esta 2ª divisão coloca as equipas a
morder os calcanhares umas às outras, para depois irmos com metade do
trabalho que conseguimos, indo com a incerteza de saber se mantemos,
mesmo tendo realizado uma primeira fase fantástica. Existem ainda
aquelas equipas no que apenas fazem uma aposta mais séria em jogadores
na 2ª fase para conseguir o objectivo no espaço de 1 mês e meio,
objectivo esse não conseguido nos seis meses anteriores. Qual a lógica
disto?
Depois
ainda temos outra questão: de existir equipas que ganham 2 jogos na 2ª
fase e o objectivo está conseguido e depois já ninguém quer nada com o
resto, e as direcções a pagar, ou subsidiar esse resto. Tem lógica?
Mas
o que realmente não faz sentido é apenas subir duas equipas para a Liga
Sportzone. Não faz sentido gastar-se mais para subir do que para manter
na 2ª divisão, pois haverá sempre um 2º classificado das seis séries
continentais, que muito tenha gasto para tentar subir que sabe que
poderá não conseguir, pois o 1º classificado da série açores vai entrar
nessas contas. E já agora, porque a AF Madeira não aceitou criar ou
entrar com uma Série Madeira na 2ª divisão, já alguém alguma vez se
questionou? E porque de uma associação bater o pé à FPF e as restantes
não?
A
grande verdade é que quando se disse que os custos iam ser reduzidos
com este quadro competitivo, quando se disse que se ia conseguir que não
houvesse mais desistências de equipas e que a qualidade competitiva ia
aumentar, apenas se fez isso: disse-se. Não se trabalhou para tal,
porque mais uma vez são os clubes que tem de olhar por si com todas as
dificuldades inerentes ao processo em que se está inserido.
Quando
se fala do diferencial financeiro duma distrital para uma 2ª divisão, o
mesmo não está relacionado com as taxas de jogo e no gasóleo para os
jogos, está sim nos subsídios que tem de se pagar aos jogadores para
poderes ser competitivo. Porque se não conseguires ser competitivo,
podes esquecer, pois a passagem pela 2ª divisão não passará de mais do
que isso, de uma breve passagem que depois poderá trazer consequências
no futuro do clube.
Outro
problema inerente a este processo é a formação das séries: não existe
um clube que saiba ou, em que série irá estar inserido ou, quais as
equipas que vai defrontar. Depois é à vontade do freguês. Porque se
atentarmos às linhas demográficas do país, há qualquer coisa que não
bate bem, por exemplo: na época 2015-16 o Mogadourense da AF Bragança
estava inserido na série B, o Caxinas e o Póvoa na série A. Na época
anterior o Mogadourense passou para a A, trocando com o Caxinas que
passou para a B. Mas porque o Póvoa ficou na A? Para a série B não ter
10 equipas da AF Porto? E porque os Amigos Abeira Douro são a única
equipa da AF Vila Real a permanecer na série B e todos os outros
envolvidos não? E porque a AJAB Tabuaço esteve há dois anos atrás na
série B e agora poderá ir para a C, se está mais perto dos clubes da B?
Só porque pertence à Af Viseu? Não se entende, não tem lógica. Tal como a
situação do Póvoa e do Caxinas, que pelos vistos este ano vão estar
inseridas na série B…qual a lógica? Qual o verdadeiro sentido?
Apenas dou exemplos sem querer ferir susceptibilidades de ninguém, nem dos clubes dados como tal.
Uma
coisa é certa: com este quadro competitivo os gastos continuam iguais
ou superiores, as equipas continuam a desistir e a qualidade competitiva
não aumentou tanto como era previsto. Há séries equilibradas, outras
nem tanto.
Isto para referir
aqueles clubes que mesmo após ter sido campeões distritais acabam os
seus projectos não subindo; ou os outos clubes que mesmo ficando nos
lugares abaixo e com convites por parte da FPF e seus Associados, não
aceitam ir para a 2ª divisão nacional. Provavelmente não só para ficar
endividados, mas também e principalmente para não colocar em causa o
futuro do clube.
Até
quando vamos ter de levar com isto, até quando os manda chuva vão
querer tapar os olhos com uma peneira e deixar de olhar só para as
selecções nacionais ou a liga sportzone?
Até quando?
Por: Fernando Parente